O sucesso de uma empresa não se resume apenas à sua estrutura física, ao seu produto ou serviço oferecido. Um dos pilares fundamentais para a consolidação e crescimento de qualquer organização é a gestão eficiente de Recursos Humanos.
O setor de RH desempenha um papel estratégico na empresa, atuando como um elo essencial entre o empresário e os colaboradores. Os Recursos Humanos vai além da contratação e demissão de funcionários, envolvendo diversas atividades relacionadas ao gerenciamento e desenvolvimento dos talentos dentro da organização. A área desempenha um papel fundamental na consolidação de uma empresa, promovendo a gestão adequada das pessoas e o desenvolvimento de suas competências e habilidades.
E na matéria especial de capa da Revista Guia JP deste mês, temos o prazer de trazer uma entrevista exclusiva com duas mulheres inspiradoras, Vania Ferrari e Anna Nogueira, que recentemente realizaram uma incrível viagem pela Ásia, com destaque especial para sua visita ao Japão. Além de serem aventureiras, Vania e Anna também são conhecidas por seu canal no YouTube, “Vania Ferrari e Anna: Pensamentos Transformadores”, que se tornou um verdadeiro sucesso desde sua criação em 2014.
Elas mantêm o canal “Vania Ferrari e Anna: Pensamentos Transformadores
Com 63 mil inscritos, mais de 500 vídeos publicados e 1 milhão e 200 mil visualizações (Tudo isso até o momento desta entrevista), seu canal é considerado o maior sobre gestão de carreira e RH do Brasil. Preparem-se para se encantar com as histórias e conhecimentos compartilhados por Vania Ferrari e Anna Nogueira.
Suas experiências na Ásia e sua visita ao Japão certamente abrirão nossos horizontes e nos inspirarão a buscar nossos próprios caminhos transformadores.
Confira, a seguir, a entrevista exclusiva concedida à revista Guia JP.
GUIA JP: Estamos com duas especialistas em RH, com um currículo invejável e grande bagagem de mercado. Por favor, se apresentem.
VANIA FERRARI: Sou administradora e tenho MBA em gestão de pessoas, que é o assunto que eu mais gosto no mundo, isto é, sobre gente. Brinco que eu tenho uma cara de maluca, mas eu sou CDF e gosto de estudar e essa é um pouco da minha história acadêmica. Profissionalmente falando, eu tenho passagens por diferentes marcas.Comecei a trabalhar com 16 anos, e estou com 52. Lá se vão muitos anos, mais de 30 anos nas mais diferentes empresas como colaboradora e depois como líder, gestora e diretora dessas empresas.
ANNA NOGUEIRA: Sou bióloga de formação e especialista em Inovação e Criatividade pela PUC de São Paulo. Tenho experiência em sustentabilidade corporativa, atuei por mais de 15 anos nessa área, implementando as estratégias de sustentabilidade e de diversidade das empresas.
VANIA: Nós temos uma empresa de treinamento e desenvolvimento chamada “Pensamentos Transformadores”, que criamos juntas em 2013. Então, esse ano a nossa empresa faz 10 anos e nós temos viajado o Brasil e o mundo para treinar profissionais nas diferentes marcas. Isso abrange desde o chão de fábrica até o conselho administrativo, treinamento de liderança, treinamento comportamental e técnico. Atuamos sempre com o objetivo de fazer as pessoas trabalharem felizes, serem produtivas e conseguirem grana para suas vidas e para suas famílias, de um jeito mais leve e ao mesmo tempo produtivo.
GUIA JP: Qual é a importância do RH nas empresas?
VANIA: RH é a vida de uma companhia. A área de desenvolvimento humano e organizacional é o coração de uma empresa. Isso porque é ela que captura no mercado os profissionais mais corretos para cada área e que vão fazer a coisa acontecer. Se você tem as pessoas certas nas posições corretas dentro de uma empresa, você tem tudo para dar certo. Nosso trabalho é assessorar as empresas desde o processo de recrutamento e seleção para atração dos talentos até o processo de desligamento. Passamos um treinamento para que as pessoas conheçam a missão, visão e os valores daquela empresa em que estão entrando. Falamos sobre treinamento técnico e comportamental, inclusive, a gente tem um slogan que tem tudo a ver com isso: “O profissional do século 21 tem que ser bom e bom. Ele tem que ser bom tecnicamente e ter bom coração.” Depois do treinamento dos colaboradores, tem um momento importante de feedback. A gente treina os líderes e os liderados para receberem e darem feedbacks e a comunicarem o que o profissional está fazendo bem e o que ele está fazendo mal, executando isso de tal forma que a pessoa se sinta desafiada a melhorar profissionalmente. Depois tem a parte diária de comunicação, e uma das falhas mais comuns das empresas é se comunicar mal com o colaborador, não fazer com que ele entenda qual é o papel dele na organização e em que momento a organização está. É um ato contínuo dar essa comunicação, esse feedback, esse estímulo e gerar o engajamento e a motivação para que esse colaborador cresça dentro da companhia. Esse é o nosso grande trabalho.
ANNA: Tudo isso está intimamente relacionado com as práticas SG que o mercado tanto tem falado. Quando a gente olha especificamente para as práticas sociais, estamos falando do cuidado com as pessoas, sejam elas os colaboradores, líderes, os clientes ou a sociedade. Então o RH tem um papel muito importante para essa agenda ser vivida realmente nas organizações.
GUIA JP: Tenho a impressão de que as pequenas empresas, principalmente no Brasil, não ligam muito para o RH, isto é, contratam do jeito que dá. Existe uma estatística sobre quanto as empresas investem em RH no Brasil?
ANNA: Tem um importante relatório de remuneração e de tendências para o mundo do trabalho que, na edição deste ano de 2023, aponta que as pequenas e médias empresas têm o desafio e estão acelerando o processo de profissionalização do RH. Então há investimento para capacitar esses profissionais, para contratar gente que tem experiência na área, para os processos acontecerem de acordo com a necessidade do nosso tempo. Com o cuidado com essas pessoas, com o desenvolvimento desses profissionais, isso tende a se acelerar nos próximos anos.
GUIA JP: Existem algumas características da comunidade brasileira no Japão. A começar que a empresa de RH é conhecida como empreiteira (Empresa de terceirização). Dentro dessa empreiteira tem uma figura conhecida como Tantousha. Na prática, é como se ele fosse o responsável por um grupo de pessoas dentro de fábrica. Quais seriam as características ideais desse líder que vai contratar?
VANIA: Primeiro, e antes de qualquer coisa, todo mundo que trabalha com o desenvolvimento humano precisa gostar de gente. Em primeiro lugar, precisa gostar de se relacionar, de conhecer as histórias das pessoas, de conhecer as vidas dessas pessoas para compreender para onde vai cada pessoa que ela entrevista. Porque tem gente que vai funcionar muito bem num trabalho mecânico e diário ou vai funcionar durante algum tempo nessa função, porque ela tem um desejo que é ou juntar dinheiro, ou ajudar a família ou comprar algum bem que deseja. Isso motiva essa pessoa por algum tempo nesse trabalho mecânico. Se esse líder que está entrevistando essa pessoa souber qual é o sonho dela, ele consegue colocar essa pessoa numa posição que atenda suas necessidades nesse momento. Depois, ele pode ficar atento para mudar essa pessoa de função aonde ela vai performar melhor. Em segundo lugar, ele precisa estudar. Estudar não é voltar para a cadeira da faculdade ou de um curso técnico. Hoje, com a tecnologia, você consegue estudar da sala da sua casa. O nosso canal no YouTube, por exemplo, se propõe a ajudar essas pessoas a estudar estando em casa. “De volta ao mundo do trabalho” é o nome do nosso projeto. Nele, entrevistamos brasileiros e brasileiras, assim como você, para entender sobre os mercados, e isso vira conteúdo que a gente posta lá no canal. Os tantoushas do mundo inteiro podem colher informação lá. E a gente traz informação técnica para esse cara estudar, para essa mulher estudar e entender como recrutar bem, como treinar bem, como observar o momento certo de pegar aquele profissional que é uma joia rara e colocar numa outra função.
GUIA JP: Fale mais sobre o canal de vocês no YouTube.
VANIA: O canal se chama “Vania Ferrari e Anna: Pensamentos Transformadores” Quando eu comecei o canal, a Anna ainda estava nas empresas, com um importante papel num banco. Então, a princípio, o canal era só meu e, por acaso, a gente registrou como Vania Ferrari. Hoje, se você entrar lá, vai ver cinco anos de conteúdos meus e da Anna, onde a gente fala sobre todos os assuntos. Dentro do nosso canal, você busca por palavra-chave. Então, por exemplo, eu quero um treinamento sobre feedback. É só digitar o tema e você vai encontrar uns três, quatro vídeos sobre feedback. Um dos vídeos mais vistos é o da Anna, que ela fala sobre Práticas SG.
ANNA: Uma coisa que a gente tem o cuidado de fazer é produzir um conteúdo que simplifica conceitos. Então não importa o segmento no qual você atua, ali você vai encontrar conteúdo que te orienta para o desafio que você estiver naquele momento. São dez, quinze minutos cada vídeo, com uma aula completa sobre cada tema. É o jeito que a gente encontrou de democratizar o acesso ao conhecimento. A formação executiva não é acessível para todo mundo, ela é cara ou ela é demorada, e os profissionais precisam resolver problemas hoje. Então ali tem diferentes temas que podem ser consumidos sem moderação pelas pessoas.
GUIA JP: Voltando ao tantousha. Que tipo específico de conhecimento ou habilidades ele deveria buscar para se especializar e superar a concorrência, considerando a necessidade de melhorar seu desempenho e sua capacidade de contratação?
VANIA: Primeiro, ele tem que ser uma pessoa organizada. Então a gente fala sobre gestão do tempo no nosso canal. Administração do tempo e técnicas para priorizar as atividades. Tem coisas que a gente faz durante o dia que nos ocupam, mas não agregam valor para o trabalho. Sabe aquele dia que termina e você fala, “Nossa, eu trabalhei tanto e estou exausta, mas não fiz nada”? Então, há técnicas de gestão do tempo, de administração de tarefas, de priorização que esses profissionais têm que desenvolver. No nosso canal no YouTube a gente estuda vários livros e publica quase que uma resenha, um resumo dessas técnicas de administração do tempo. Tem outra coisa que tem a ver com a pessoa ter um pensamento estratégico. Pensar na estratégia do negócio. O que eu preciso fazer? Como é que eu me comunico com essas pessoas? Como é que eu encontro essas pessoas? É preciso lembrar que você faz a ponte entre esses profissionais. E quais ferramentas eu vou usar, sejam elas digitais ou analógicas? Como é que eu chego nessas pessoas? E uma vez que eu recebo esse currículo, esse perfil, esse profissional na entrevista, tem que ter a técnica de entrevista. Outra questão é o que eu pergunto para essas pessoas? Como é que eu separo o joio do trigo, alguém que vai me dar muito trabalho lá na ponta que o cliente vai ficar superinsatisfeito e que rapidamente eu vou ter que substituir, comprometendo a minha reputação nessas grandes marcas que você citou? E ao contrário, como é que eu trago a pessoa certa que o meu cliente vai agradecer e falar, poxa, eu quero contratar essa pessoa, não quero nem mais que ela seja terceirizada, eu quero que ela trabalhe aqui? Isso, na verdade, é um grande troféu para esse recrutador, que é quando o cliente agradece porque ele levou aquela pessoa para a empresa. Tudo isso são técnicas que estão disponíveis lá, tanto para o recrutador quanto para o recrutado.
ANNA: A gente tem uma playlist com conteúdos para quem quer mudar de carreira ou mudar de emprego. Tem dicas para você montar o seu currículo, de como você pode comunicar quem você é nas redes sociais, como se preparar para uma entrevista, como cuidar da sua forma de se comunicar para avaliar se você está sendo claro na hora de se comunicar, para contar quem é você, a experiência que você traz; enfim, são diversas pílulas para esses profissionais que querem evoluir nas suas carreiras, independentemente da área.
GUIA JP: Fato é que existem líderes ruins. Então, como identificar isso do ponto de vista de quem precisa desenvolver líderes?
VANIA: Eu adoro esse assunto. Primeiro porque nós sabemos que existe uma crise mundial de liderança. É muito difícil você ir para a noite e não escutar na mesa do lado alguém falando mal do chefe. Eu trabalhei 30 anos em empresas, em mais de dez marcas diferentes, tive centenas de chefes, e, se três foram bons, isso foi muito. E quando eu conto essa história, as pessoas refletem e dizem a mesma coisa. Então existe uma crise mundial antiquíssima de liderança ruim. Os líderes são chefes na sua maioria, ou seja, são pessoas que não gostam de gente, mas querem resultado e acabam assediando moralmente os seus colaboradores para tentar obter resultado. Isso funciona durante algum tempo, mas não a vida toda. As pessoas espanam. A principal competência de um líder tem a ver com a capacidade de extrair o melhor do outro, e não o pior. Um líder que está sempre bravo, sempre irritado, que fala num tom alto com as pessoas, chega a mudar o batimento cardíaco delas. Então, quando esse chefe chega perto de mim, meu coração dispara, eu não oxigeno o cérebro e, portanto, vou errar. Um bom líder tem que saber que ele impacta a vida do seu colaborador. E se ele for sempre agressivo, se ele for sempre arredio, se eu tiver um ambiente hostil, as pessoas vão mais errar do que acertar. Que é o contrário do que essa pessoa quer e precisa. Para ser um bom líder você precisa saber que o seu papel é fazer as pessoas evoluírem. Que você está lá a serviço daquelas pessoas e não o contrário. Você precisa que essas pessoas performem bem. E para isso, você tem que ter inteligência emocional. E aí eu chego na sua resposta. A principal característica de um profissional neste momento é a inteligência emocional, que tem a ver com ele não confundir a vida dele com o trabalho no sentido de, se ele bater o carro, se ele teve uma briga com o síndico do prédio, chegar na empresa e não explodir com as pessoas. Ele tem que chegar na empresa, ou na fábrica, ou no ambiente de trabalho, respirar fundo e entender. “Bom, esse é mais um dia em que eu vou fazer as pessoas darem o seu melhor.”
GUIA JP: Essa pessoa pode desenvolver essa inteligência emocional?
VANIA: Sabe aquela coisa que a gente pega um ótimo técnico e transforma num péssimo líder? É basicamente isso. Tem gente que tem mais facilidade para liderar. Tem gente que tem menos facilidade. Porém, essas competências são desenvolvíveis. Se a pessoa quer ser um bom líder como um presidente de uma empresa, como uma diretora de uma empresa, como uma presidente, essa pessoa precisa estar bem. Precisa fazer uma terapia, ter um hobby, se exercitar, se alimentar bem, precisa ter a sua roda da vida, que é como a gente chama, em dia. É preciso cuidar de todos os aspectos da vida, ser uma pessoa feliz, porque gente feliz ajuda o outro, gente feliz não atrapalha o outro. O que a gente vê é muito psicopata na liderança. Tem uma pesquisa nos Estados Unidos na qual indica que tem 1% de psicopatas habitando o país. Quando você faz essa mesma pesquisa dentro das empresas você descobre que 4% são presidentes. Ou seja, uma presidência atrai psicopata. Por quê? Porque é um lugar onde eu exerço o poder, onde eu posso ser tirano, onde eu posso falar e todo mundo vai me ouvir. Com essa perspectiva, as empresas começaram a perceber que elas tinham que recrutar melhor os seus líderes, e nesse processo, trazer pessoas saudáveis emocionalmente. Pessoas que acabam o expediente e vão para casa jantar com seus familiares, brincar com seus filhos, fazer seu esporte, seu hobby, exercitar alguma outra competência emocional. São pessoas que vão ao museu, que vão ao teatro, que ouvem música. A arte é importante para destravar essas competências nos líderes. Então, é ser uma pessoa boa em primeira instância e a técnica vem depois. Eu posso aprender sobre como funciona uma empresa, como funciona um banco, um produto ou um serviço, mas se eu não for uma pessoa boa não adianta, entendeu? Isso passa por inteligência emocional.
GUIA JP: Como engajar líderes a se tornarem intraempreendedores?
VANIA: Temos um vídeo no nosso canal chamado “O bendito olhar de dono”. Eu acho que a Ana pode explicar um pouquinho sobre essa competência.
ANNA: Num primeiro momento, a gente precisa entender que olhar de dono é do dono. Se você não é o dono você não vai ter esse olhar. Mas você é dono da sua carreira. Você é dono daquele conjunto de desafios que te foram oferecidos. Então você tem que ter esse desejo de entregar o melhor, de identificar o que pode ser formado e buscar continuamente simplificar processos, trabalhar de uma nova forma, ser mais eficiente. E essas são coisas que vão fazer bem para sua carreira. Você vai olhar com orgulho para sua trajetória e vai ser bom para sua equipe, porque sempre vai ter aquele olhar de, poxa, isso a gente tem feito dessa forma, mas a gente pode fazer diferente. A gente pode usar os nossos recursos, sejam eles os recursos naturais, financeiros, o tempo, ou através da busca pela eficiência. Vamos fazer mais rápido de uma maneira mais divertida, mais inteligente. E tem uma coisa muito importante para líderes e equipes quando a gente fala de olhar de dono, de intraempreendedorismo e de inovação, que é a busca pela solução de um problema real. A gente tem que inovar olhando em longo prazo o futuro do segmento onde a gente está inserido? Sim, mas a gente também precisa entender como identificar o que é urgente e resolver, seja a forma de atender o cliente, seja a forma da linha de produção numa fábrica, enfim, todos os processos de trabalho requerem um olhar ávido por transformar, por resolver problemas. E a gente acredita que trabalhar é resolver problema.
VANIA: Eu sempre trabalhei em empresa grande, como a GE, a IBM, a Vivo, a America Online e tal. E em uma empresa grande, quarenta mil funcionários, trinta mil funcionários, cinquenta mil funcionários, você é uma pessoa que está ali fazendo o seu trabalho e se bobear ninguém te vê. Passa anos e ninguém te vê. O que eu fiz a minha vida inteira? Eu pegava a minha equipe e falava assim: “Aqui no nosso pedaço a gente vai arrebentar, a gente vai arrasar, a nossa área vai ser impecável, vai ser limpa, organizada, as nossas pessoas vão ser bem humoradas, vão ajudar as outras pessoas. A gente vai começar a ser olhado de um jeito diferente”. Fazia um pacto com a minha equipe. Quero com isso que as pessoas venham olhar, falar o que essa área faz. Que essas pessoas estão sempre alegres, entregam os resultados e batem meta. Então a gente meio que se unia em prol de fazer a nossa área brilhar. Esse é o olhar do intraempreendedor. É olhar de alguém que pega o orçamento da empresa, a equipe da empresa e usa como sua. Ser intraempreendedor é um ótimo negócio. As pessoas falam que é cafona ficar vestindo a camisa da empresa. Cafona é falar mal da empresa onde você trabalha.
GUIA JP: O que estamos falando tem a ver com a sustentabilidade da empresa?
ANNA: Isso é a prática da sustentabilidade. Porque quando a gente fala dos aspectos ambientais da agenda de sustentabilidade, parece algo distante do dia a dia. Mas toda vez que a gente busca eficiência a gente revê o jeito que está trabalhando, ou seja, a gente está sendo, consequentemente, sustentável. Quando a gente tem melhor equilíbrio do tempo, quando as pessoas conseguem entregar o que elas precisam e conseguem sair no horário, exercer suas outras funções, estudar, se divertir para além do trabalho, a gente está sendo sustentável. Então essa agenda é muito ampla e, de novo, ela está no dia a dia do trabalho de qualquer profissional, independentemente da área na qual ele atue.
GUIA JP: Queria falar sobre quem vai entrar na empresa. Vamos começar com uma ideia de gerações e fazer um resumo do que motiva cada uma delas na hora de construir uma carreira?
VANIA: Eu gosto muito de usar a arte para exemplificar o trabalho. Tem uma música do Titãs que fala “A gente não quer só dinheiro, a gente quer dinheiro, diversão e arte”. Essa geração atual requer muito isso, nunca é só dinheiro. Eles querem poder ter uma vida fluída, uma vida divertida, uma vida em que não se sintam presos a uma marca. Meu pai era metalúrgico e trabalhou 40 anos praticamente na mesma empresa. Eu, com 30 anos, trabalhei em dez marcas diferentes. Meu sobrinho de 20 anos trabalha hoje para três empresas diferentes, no mesmo dia, como freelancer. Essas diferenças acontecem, mas eu nunca associo muito à idade. Eu associo mais ao momento. Sou uma mulher de 52 anos que tem uma vida fluida. A gente é nômade digital, a gente trabalha de qualquer lugar do mundo. O que eu procuro como profissional? Eu procuro ganhar minha grana honestamente, construir relações que sejam de qualidade com as pessoas e ser feliz na minha vida, no meu casamento e na minha história. Se você for falar com qualquer pessoa, todo mundo quer mais ou menos isso. E tem gente mais ambiciosa e menos ambiciosa. Às vezes as pessoas querem ser gerente só para ganhar mais. E aí a vida dela vira um inferno porque ela não gosta de gerenciar pessoas. Então a gente tem falado muito com os RHs para que promovam essas pessoas dentro das companhias, não para serem líderes, mas para serem especialistas. Elas vão ganhar mais fazendo o que gostam. O que essas gerações procuram? A medida da sua ambição é ter a grana, a felicidade e a saúde mental que precisam. Porque estamos vivendo um momento de muita gente se afastando do trabalho por dificuldades emocionais, porque estão sendo absurdamente cobradas por algo para o qual elas não foram treinadas, num cargo para o qual elas não servem. Qual é a ambição de qualquer pessoa? Vou ganhar minha grana, vou ser feliz, ter saúde em primeiro lugar, porque sem saúde a gente não faz nada. Então a gente tem visto essa mudança. Nós temos amigas que abdicaram de um cargo mais alto, de uma cadeira no conselho administrativo, de uma presidência, para trabalhar menos horas e ter mais qualidade de vida. Vejo esse movimento acontecer em todos os lugares.
GUIA JP: Ao direcionar estratégias de marketing para as gerações mais recentes, como podemos posicionar uma empresa de forma a atrair aqueles que buscam um estilo de vida mais livre e desejam deixar um legado para o mundo, mesmo que não estejam interessados em buscar status tradicionais de emprego?
VANIA: A Anna é a especialista nesse assunto, mas é verdade, eu não quero associar meu nome a uma marca que eu não respeito. Por exemplo, quando o Elon Musk fez aquela lambança no Twitter, várias pessoas físicas e jurídicas pararam de usar o Twitter. Imediatamente. Eu não quero dar dinheiro para uma marca que faz o que ele faz com as pessoas. Isso faria mal para a minha saúde. Tem marcas que eu não uso. Todas as marcas de moda que foram pegas usando trabalho escravo, são marcas que eu não uso mais. São roupas que eu não uso mais, não compro, não passo na porta da loja. O mesmo acontece com todo mundo que tem o mínimo de consciência.
ANNA: A agenda de sustentabilidade entrou muito fortemente nos aspectos financeiros. Se eu, colaborador, vou ajudar a minha empresa a ter mais lucro, eu quero que tenha lucro uma empresa que combina com os meus valores, que está construindo um mundo onde eu quero viver, onde eu quero que os meus sobrinhos vivam e tal. Eu vou escolher trabalhar nessas marcas e vou recusar propostas em outras mesmo que o salário seja maior, porque no longo prazo, essas empresas vão deixar de existir. Você precisa seguir as práticas SG, sociais, ambientais e de governança para garantir a perenidade do seu negócio. É também uma conversa sobre valores. A mesma coisa para o consumo. Antes a gente tinha orgulho de estampar uma marca porque era uma marca de luxo ou sinônimo de modernidade. Hoje, a gente cada vez mais quer estampar uma marca que combina com os nossos valores. Vale para trabalho, vale para consumo. GUIA: É possível alcançar sucesso na carreira sem amar o que se está fazendo, considerando a perspectiva de que fazer o que se ama é fundamental para obter êxito, conforme mencionado por Steve Jobs?
VANIA: Por um tempo. Por exemplo, às vezes no primeiro emprego a gente tem que fazer algo que não necessariamente está ligado ao nosso talento, é o ofício para ganhar dinheiro. Mas sabemos que é por um tempo. Então fazemos bem feito porque tem a ver com a nossa reputação, algo que carregamos para onde formos. Já tive colaboradores na minha equipe que diziam claramente não querer trabalhar em determinada empresa. Dizia que o sonho é, sei lá, ser veterinário. E eu trabalhava numa empresa financeira. Mas eu dizia que não tinha problema, que ele seria veterinário. Só que para que isso acontecesse, era preciso passar por essa etapa, então que fizesse bem, com carinho, com dedicação e com alegria. Tem coisas no trabalho que são chatas mesmo, como, por exemplo, emitir nota fiscal. Mas se eu estou emitindo a nota fiscal é porque eu fiz um bom trabalho e estou recebendo do meu cliente. Não é que tem que amar emitir nota fiscal, ninguém ama emitir nota fiscal. Mas eu vou fazer porque é fruto ou etapa de um trabalho que eu estou construindo em longo prazo.
GUIA JP: Na prática é fazer o que der até conseguir fazer o que gosta.
VANIA: Sim, mas faz bem feito. Não faz zoado não que a conta vem, porque daqui a dez anos alguém vai pedir referência para esse empregador e você vai comprometer a sua reputação. Então faça bem feito.
GUIA JP: E eventualmente talvez o networking construído no que você está fazendo agora vai te ajudar a fazer o que você ama.
VANIA: É muito isso. Num processo de recrutamento e seleção você vai para uma entrevista, performa bem, no entanto não passa. Mas você foi elegante, educado e correto. Daqui a algum tempo essa pessoa vai te ligar para falar que para aquela vaga você não passou, mas para essa outra ela está te chamando. Mesma coisa no trabalho. O nosso trabalho é difícil de vender. A gente vai numa empresa, faz uma apresentação, passa um dia, nosso telefone toca com alguém dizendo que o marido viu a palestra na empresa dele e nos convida para palestrar na empresa dela. A gente brinca que nós somos as famosas “ninguém”, mas a gente não para de trabalhar, porque uma pessoa indica para a outra, outra indica para outra e isso chama reputação. Vale para o nosso segmento e vale para pessoa física também.
GUIA JP: Eu quero trazer um pouco para a comunidade brasileira. Mas passando um pouco da minha visão de perfil. A ideia são brasileiros que no final da década de 80 começaram a vir para o Japão, e a maioria sem qualificação técnica. Depois de vinte anos volta para o Brasil. Na opinião de vocês, é possível que essa pessoa, depois de dez, vinte anos aqui, desenvolva uma carreira a partir desse momento?
VANIA: Totalmente, principalmente no mundo que a gente está vivendo agora. Veja, a gente está envelhecendo mais, a gente está vivendo mais e, portanto, a cada dez anos você pode ser especialista numa carreira completamente diferente da que você teve hoje. Até porque nós somos multitalentosos. O ser humano é uma potência inacreditável. A gente pode aprender o que a gente quiser a hora que a gente quiser. A Tomie Ohtake começou a pintar com 40 anos de idade. Tem casos de pessoas que desenvolveram novas habilidades a partir dos 50. Eu tenho uma mãe de 83 que faz aula de piano e faz aula de inglês. Então não existe mais essa limitação. Isso mudou. Então você pode, sim, com dedicação e vontade, fazendo as escolhas certas, desenvolver habilidades em qualquer carreira para qualquer coisa. Existem caminhos, técnicas, fontes que você tem que procurar, mas qualquer pessoa pode fazer qualquer coisa. No nosso caso foi assim. A nossa empresa de treinamento e desenvolvimento tem 10 anos. E no comecinho eu tive que aprender coisas novas. Eu sempre fui CLT, eu nunca pensei em ter uma empresa. Eu tinha medo de ter empresa. Imagine, meu pai era metalúrgico, então eu tinha medo de abrir uma empresa não sabendo como é que eu pagaria imposto, como se calculava um, ou até mesmo como é que se fazia para ter um contador. Eu achava muito complicado, mas quando eu abracei essa carreira de treinamento e desenvolvimento, que eu tive que criar uma empresa, eu criei do zero. Eu fui fazer as redes sociais do zero, eu fui fazer contato do zero, eu fui fazer network do zero e eu já tinha 40 anos.
GUIA JP: Que dica vocês dariam para um brasileiro Buscando desenvolver uma carreira mais qualificada depois de vinte anos no Japão, seja aqui ou no Brasil?
VANIA: Brasileiro é aguerrido, brasileiro é maravilhoso e você sabe que a gente está fazendo essa turnê e a gente está falando com brasileiros em cada um desses países. A gente falou com o pessoal em Bangkok, em Melbourne, em Singapura e em Oakland. E hoje vamos falar com uma galera de brasileiros aqui no Japão. O brasileiro tem essa característica, ser aguerrido, de ser um povo divertido, de ser um povo mão na massa, então esse é o primeiro ponto, você ter vontade de fazer as coisas e você não ter medo, porque o medo bloqueia a gente. Obstáculo todo mundo vai enfrentar, isso se chama vida. A vida é cheia de percalços. Não estou ignorando aqui que tem gente que tem mais privilégios e tem gente que tem menos privilégios, mas uma vez que você é brasileiro, o primeiro ponto é leia, estude, fale com as pessoas, se mexa, dê os seus pulos, entendeu? Seja uma pessoa sacudida, que vai ligar para as pessoas, que vai mandar e-mail, que vai conversar, que vai atrás daquilo que você almeja, seja lá o que for. Isso a gente está vendo acontecer, brasileiros chegando nesses países pelos quais passamos com a cara e com a coragem. E também destravando essa competência de saber que a gente consegue o que a gente quiser.
ANNA: Agora, acho que algo muito importante é você investir tempo para pensar sobre a sua carreira. A gente tem um caderno em que anotamos de onde a gente vem, desde que começamos a trabalhar, e quais são os próximos passos que a gente gostaria de dar na carreira. Então você vai investir tempo nisso, ter uma tarefa mesmo, seja ela semanal ou mensal, para olhar para si mesmo. Reflita sobre o setor em que você trabalha agora, para onde gostaria de ir, se quer evoluir nesse mesmo cargo, nessa mesma área ou se quer mudar de carreira. Pensar sobre essas questões vai fazer você buscar o conhecimento necessário para o próximo passo. E aí você vai escolher o que ler e que cursos fazer, tem muita informação à distância disponível, muitos cursos on-line. Se munir dessa informação é muito importante.
GUIA JP: Voltando um pouco, como uma pequena empresa pode identificar e contratar pessoas mais produtivas para suas necessidades?
ANNA: Existem várias técnicas para você contratar. Primeiro você precisa ter clareza de qual é a missão, visão e valores dessa sua empresa, seja ela novíssima, pequenininha, média ou grande. O que eu quero fazer? Para além dos meus produtos e serviços e por eles também. Que tipo de produto eu vou fazer e como ele vai melhorar a vida das pessoas? Qual a razão de existir dessa empresa? Você tendo clareza disso, vai atrair os melhores profissionais, mas é preciso ter um olhar para diversidade, e isso inclui todas as diversidades, de idade, de classe social, e de gênero. Todas as diversidades precisam compor o seu time para você ter olhares múltiplos, porque os clientes vão ser múltiplos. Para você responder aos diferentes desafios você tem que ter uma equipe muito diversa. Isso vai trazer benefícios de engajamento dos profissionais, de produtividade, de eficiência, de posicionamento e de valor de marca. Todos esses benefícios são atingidos a partir desse olhar para a diversidade.
GUIA JP: Eu não sabia a riqueza desse assunto que entramos. Tenho pelo menos umas vinte perguntas ainda. Gostaria de agradecer, mas não conseguiria terminar essa entrevista sem perguntar: a inteligência artificial vai acabar com os empregos?
VANIA: No canal a gente divulga nossos estudos, as pesquisas, os livros que estamos escrevendo, os livros que estamos lendo, aliás, nós temos dois livros já editados. E nesses livros a gente fala sobre vários aspectos, um deles tem a ver com inovação, e um dos capítulos do livro é “O que o Vale do Silício tem que o Vale do Anhangabaú não tem”. A inovação, a tecnologia, a inteligência artificial não vão acabar com os empregos, eles vão criar mais empregos. Contudo, você tem que estar melhor preparado. Quais são os trabalhos que a inteligência artificial vai fazer? Todos aqueles que são burros. Tudo aquilo que pode ser automatizado. Esses disparos de e-mails que eram manuais, disparos de mensagens que eram manuais, área de telemarketing que faz contato para venda. Todas essas coisas que são mecânicas e que se fala a mesma coisa o tempo todo que um robô pode fazer, isso vai deixar de existir para nós humanos. Só que nós, humanos, somos os que programam a inteligência artificial. Então, áreas como tecnologia, o estudo e a propagação da inteligência artificial, criação de códigos, algoritmos, esses trabalhos vão requerer a inteligência humana. A arte, a psicologia, a história, a literatura, trabalhos de gestão de pessoas, tudo que tem a ver com o uso criativo e humano para a confecção de produtos e serviços vai aumentar a demanda. Então qual é a mensagem para você que tem medo de perder o emprego? Olhe para o seu emprego, olhe para o seu trabalho. O que você faz pode ser automatizado? Se sim, você rapidamente já comece a estudar, a princípio informalmente, não precisa gastar dinheiro com isso agora. Mas comece a ler e a estudar, tem vários artigos que dão o caminho para sua carreira. O nosso canal, sem nenhuma modéstia, se propõe a fazer isso, a criar conteúdo para você absorver, aprender e poder evoluir. Então entra lá no YouTube, canal Vania Ferrari, que você vai encontrar conteúdos que vão te encaminhar. Por exemplo, a hospitalidade é outra área em crescimento, as áreas de saúde também. Novos produtos com esse conhecimento do que é belo, justo e bom vão aumentar o tempo todo. É só você procurar uma que tem mais a ver com a sua personalidade e ganhar um novo ofício.
ANNA: Eu concordo totalmente. Na verdade, vai haver uma substituição e a gente vai poder exercer coisas que são muito mais interessantes, que possibilitam o uso da criatividade e que vão fazer a gente até ter uma melhor relação com o trabalho, porque quando a gente consegue exercer uma função que permite o uso da nossa inteligência, das nossas expressões criativas, do contato com o humano, a gente tende a ser mais feliz e ser mais engajado com esse tipo de ofício.
VANIA: E assim ganha mais dinheiro. Não é que você nunca mais vai ter que trabalhar, mas você vai trabalhar feliz. Você vai trabalhar desenvolvendo pessoas. Mas só quem trabalha com RH desenvolve pessoas? Não. Você pode estar no chão de uma fábrica, pode estar operando uma máquina. Se você for uma pessoa boa e consciente, você está influenciando quem está trabalhando do seu lado. Em qualquer função você vai influenciar as pessoas positiva ou negativamente. Aí é você quem escolhe. A gente sabe que o seu sucesso é proporcional à quantidade de pessoas que você ajuda a ter sucesso. Essa é outra máxima que a gente sabe que se aplica, transforma a sua carreira e a sua vida.