Arte e encantamento nas Ilhas de Kagawa

Banhada pelo Mar de Seto, a província tem uma das costas mais belas do Japão

Leitura obrigatória

Roberto Maxwell
Roberto Maxwellhttp://www.tokyoaijo.com
Radicado no Japão desde 2005, atua como produtor de conteúdo multimídia e acumula trabalhos como repórter, documentarista, produtor e palestrante. Apaixonado por viagens, dedica-se a percorrer o arquipélago e registrar suas maravilhas e contradições.

Uma das quatro províncias de Shikoku, Kagawa é mais conhecida pelo udon, um tipo de macarrão japonês grosso e feito com trigo. Takamatsu, a capital da província, recebe udon-maníacos de todo o país, ansiosos por provar a iguaria in loco. No entanto, é nas ilhas que Kagawa brilha. Localizadas no Mar Interior de Seto, são destinos cobiçados, em especial pelos jovens, em busca de experiências artísticas mais arrojadas e fora da caixa. Mas não é só a arte que atrai visitantes para as ilhas que salpicam o litoral de Kagawa. Apelidado de Mediterrâneo Japonês, o Mar Interior de Seto é rico em belas paisagens, com suas águas verde-esmeralda que banham montanhas cobertas de florestas. Viaje com a gente por três ilhas que causam encantamento na província de Kagawa.

Ponte que conecta as ilhas de Shikoku e Honshu (foto: Pixta)

A ilha do shoyu

Segunda maior ilha do Mar Interior de Seto, Shodoshima é conhecida pela produção de molho de soja shoyu. Além de mais de uma dezena de pequenas fábricas, a ilha também abriga uma das maiores produtoras do país, a Marukin. No antigo espaço de produção, a empresa criou um museu que dá uma boa ideia de como o molho onipresente nas mesas japonesas era produzido no passado e, de certo modo, ainda é nas pequenas fábricas.

ARTE E ENCANTAMENTO NAS ILHAS DE KAGAWA
Fábrica de shoyu em Shodoshima (foto: Pixta)

O shoyu, como vários outros ingredientes das gastronomias orientais, é um produto fermentado. Soja e outros grãos são inoculados com o fungo Aspergillus, conhecido em japonês como koji, iniciando o processo de fermentação. Num processo lento, o mosto pode ficar fermentando por vários meses em impressionantes barris de madeira. Aliás, Shodoshima é a localidade do país com maior concentração de barris do tipo.

O Museu do Molho Shoyu da Marukin traz representações com esculturas do processo de produção tradicional do ingrediente. As legendas em inglês ajudam a quem não consegue ler japonês. Visitantes pagam ¥400 para entrar, mas, além da visita, ganham de presente um frasco do molho produzido no local e um cupom para uso na lojinha. Vale provar o sorvete de shoyu, doce e gostoso.

Mas a grande oportunidade na ilha é visitar as produções artesanais em fábricas como a Yama-roku, uma das poucas do Japão a produzir o shoyu somente em barris de madeira.

A ilha do shoyu
Shoyu sendo preparado de forma artesanal em Shodoshima (foto: Pixta)

Em todo o país, apenas 1% da produção total do molho é feita dessa maneira. Orgulhosa, a empresa convida os visitantes a passear na plataforma construída na altura da boca dos barris e ver de perto o mosto em fermentação nos barris abertos. É possível ver como o shoyu pode ser um alimento “vivo” e sentir o aroma profundo do processo de fermentação.

A fábrica também tem um café em que são servidos o yakimochi, um bolinho de arroz caramelizado no shoyu e sobremesas feitas com o molho. A visita é gratuita, mas não se pode ter comido natto nas 24 horas anteriores à visita, já que o alimento deixa resíduos imperceptíveis que podem contaminar o mosto.

… e das azeitonas

Shodoshima também tem a maior produção nacional de azeitonas. O clima mediterrâneo do Mar Interior de Seto impulsionou uma iniciativa para produzir a frutinha no país e Shodoshima foi o primeiro lugar em que as oliveiras vingaram. Localizado numa encosta à beira-mar, o Parque das Oliveiras é um local em que os visitantes podem passear entre os pés de azeitona e ter uma bela vista das plantações e do mar. Para trazer um clima mais “ocidental”, o parque tem moinhos de vento em estilo europeu. No espaço, dois restaurantes trazem pratos que levam o azeite produzido na região. A Praia das Azeitonas também é um lugar bacana para dar um mergulho ou observar o mar.

azeitonas
O Mediterrâneo é inspiração na ilha (foto: Pixta)

A beleza vista do alto

Um dos pontos mais conhecidos da ilha é o Kankakei, localidade esta considerada uma das três mais belas ravinas do Japão. Partindo de um ponto acessível de ônibus, é possível subir a montanha a pé (50 minutos de caminhada) ou no teleférico (5 minutos de viagem). Do alto, a vista para o mar, com a baía de Uchinomi e as montanhas ao fundo é espetacular. A melhor época para visitar a área é o final do outono, quando as montanhas estão cobertas de árvores de folhagem amarela e vermelha.

Kankakei
O outono tornam magníficas as paisagens de Shodoshima (foto: Pixta)

Ilha abençoada

A cerca de 20 minutos de barca partindo de Shodoshima fica outra ilha que tem atraído cada vez mais atenção no Japão: Teshima. Viagem e turismo, no entanto, nem sempre foram os motivos para que a ilha estivesse nas manchetes dos jornais. Nos anos 1990, a população de Teshima resolveu denunciar a província de Kagawa e uma série de outros agentes por despejo ilegal de material tóxico e negligência com o meio-ambiente.

Foram quase 2 décadas até que todo o material depositado em Teshima fosse retirado, e ainda há questões relacionadas à poluição que ainda não foram resolvidas, embora a contaminação na ilha já não represente mais perigo aos moradores locais. Tudo isso num local que não recebeu o nome de Teshima (algo como “ilha da abundância”, em japonês) por acaso. Localizada numa área com excelente regime de chuvas, água não falta. O solo raso e as rochas vulcânicas porosas servem como filtros naturais que devolvem a dádiva dos céus em sua forma mais pura. Por isso, ao longo da história, o solo montanhoso de Teshima foi usado para a produção de arroz de alta qualidade, atividade que vem sendo retomada aos poucos por antigos e novos residentes.

Teshima
Belezas naturais são o destaque em Teshima (foto: Pixta)

Mas Teshima entrou no mapa turístico japonês quando embarcou nos projetos artísticos iniciados em Naoshima pela Benesse Holdings, uma empresa do setor editorial. Em 2010, a abertura do Museu de Arte de Teshima foi o pontapé inicial. Projetado pelo arquiteto Ryue Nishizawa, o espaço é uma obra em si mesmo, formado por duas construções que lembram naves espaciais de concreto, aterrizadas de forma discreta no solo da ilha. A obra se completa com uma instalação da artista Rei Naito, formada por discretos jatos de água que escorrem pelo amplo espaço da construção, trazendo imagens tão simples quanto hipnóticas.

Mas não é só isso. A ilha é salpicada por obras de diversos artistas japoneses e estrangeiros, instaladas na floresta, nas vilas e nas praias. Um serviço com ônibus esparsos percorre os diversos pontos da ilha. Por isso, quem quiser aproveitar bem deve alugar uma bicicleta — elétrica de preferência, já que a ilha é montanhosa. Circulando na magrela por um dia, é possível visitar todas as obras e curtir as paisagens naturais e culturais que formam a riqueza da ilha.

Teshima
Arquitetura feita de forma a se mesclar com o ambiente (foto: Pixta)

Mas Teshima entrou no mapa turístico japonês quando embarcou nos projetos artísticos iniciados em Naoshima pela Benesse Holdings, uma empresa do setor editorial. Em 2010, a abertura do Museu de Arte de Teshima foi o pontapé inicial. Projetado pelo arquiteto Ryue Nishizawa, o espaço é uma obra em si mesmo, formado por duas construções que lembram naves espaciais de concreto, aterrizadas de forma discreta no solo da ilha. A obra se completa com uma instalação da artista Rei Naito, formada por discretos jatos de água que escorrem pelo amplo espaço da construção, trazendo imagens tão simples quanto hipnóticas.

Mas não é só isso. A ilha é salpicada por obras de diversos artistas japoneses e estrangeiros, instaladas na floresta, nas vilas e nas praias. Um serviço com ônibus esparsos percorre os diversos pontos da ilha. Por isso, quem quiser aproveitar bem deve alugar uma bicicleta — elétrica de preferência, já que a ilha é montanhosa. Circulando na magrela por um dia, é possível visitar todas as obras e curtir as paisagens naturais e culturais que formam a riqueza da ilha.

Teshima
Obra de arte no porto de Teshima (foto: Pixta)

Ilha de arte

Gente do mundo se espantou quando, em agosto do ano passado, correu a notícia de que um tufão teria jogado ao mar uma obra de uma das mais importantes artistas japonesas do século 21. A ventania que atingiu Naoshima surpreendeu até os moradores quando a abóbora amarela e salpicada de pontos pretos foi vista lutando contra o mar revolto. A obra de Yayoi Kusama era uma das muitas instalações a céu aberto de Naoshima, a primeira das ilhas do Mar Interior de Seto, a embarcar no projeto de revitalização econômica através da arte capitaneada pela Benesse Holdings, uma empresa do setor editorial. O sucesso de Naoshima fez o empreendimento se ramificar e se espalhar pelas ilhas vizinhas de Teshima e Shodoshima, na província de Kagawa; e Inujima, na vizinha Okayama.

O Benesse House Museum é o centro principal das atividades artísticas na ilha. No espaço projetado pelo arquiteto Tadao Ando, fica um museu de arte, um restaurante e um hotel. Fotografias, esculturas, instalações e outras formas de arte habitam o espaço, não apenas nas galerias, mas, também, em outros espaços, como as florestas no entorno do museu.

As abóboras de Yayoi Kusama estão no entorno do porto de Naoshima (foto: Pixta)

Também de Tadao Ando é o Museu de Arte Chichu, um espaço subterrâneo todo em concreto, com obras dos artistas Claude Monet, James Turrel e Walter de Maria. O conceito da construção é não interferir na paisagem da ilha. Por isso, o prédio é quase impossível de ser visto por quem está de fora. A reserva antecipada pela internet é obrigatória.

A uma curta caminhada fica o Museu Lee Ufan, dedicado ao artista coreano radicado no Japão desde os anos 1950. Ufan é considerado um dos fundadores do movimento Mono-ha, que se contrapunha à representação na arte ocidental partindo da construção de uma relação entre os objetos e o espaço. A compreensão desse conceito já começa na entrada do museu que fica num vale à beira-mar. Em frente à construção que abriga as galerias, um enorme arco fincado na areia recebe os visitantes.

Arte na vila

Outro polo de exposições fica em Honmura, uma área da ilha de residências antigas no estilo tradicional japonês, muito bem preservadas. No bairro ficam cerca de uma dezena de instalações, quase todas elas em casas reformadas para o uso como galerias. É o The Art House Project. Diferentemente dos museus que possuem cada um o seu ingresso, a visita a seis das casas-galerias de Honmura pode ser feita com um passaporte (¥1050). Quem quiser visitar apenas algumas delas, pode optar pelo ingresso de visita única de ¥420. A residência Kinza, que precisa ser reservada com antecedência pela internet, custa ¥520 e não está inclusa no passaporte.

Também na área de Honmura fica o Ando Museum, um espaço dedicado à obra do arquiteto Tadao Ando, responsável por algumas das principais obras arquitetônicas contemporâneas da ilha.

Arte no antigo casario da ilha (foto: Pixta)

O porto principal

Miyanoura é o porto de entrada principal da ilha. Aqui ficam alguns dos principais hotéis e pousadas fora da área do Benesse House, lojas de locação de bicicletas e motos e outros pontos úteis. Também fica em Miyanoura dois projetos importantes: a Miyanoura Gallery 6, construída numa antiga casa de jogos de azar, e o Naoshima Bath I Love Yu, uma casa de banhos coletiva decorada com obras do artista Shinro Ohtake.

Miyanoura
Barca com as esferas que são marca da artista Yayoi Kusama (foto: Pixta)

Ah, no Porto de Miyanoura fica um outro exemplar da série das abóboras de Yayoi Kusama. A escultura vermelha, que forma uma bela composição com o mar no pôr do sol, está a postos para receber e se despedir de quem visita a ilha.

Miyanoura
Yayoi Kusama é uma das artistas de destaque com obras em Naoshima (foto: Pixta)
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