Mandioca é destaque na difusão da gastronomia brasileira no Japão

Série de eventos inclui pratos pantaneiros em restaurantes da capital japonesa

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Roberto Maxwell
Roberto Maxwellhttp://www.tokyoaijo.com
Radicado no Japão desde 2005, atua como produtor de conteúdo multimídia e acumula trabalhos como repórter, documentarista, produtor e palestrante. Apaixonado por viagens, dedica-se a percorrer o arquipélago e registrar suas maravilhas e contradições.

 

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Aipim, macaxeira, maniva, pão-de-pobre, uaipi: nomes tão diferentes que se referem a uma única raiz que se tornou a base da alimentação de milhões de brasileiros: a mandioca. O ingrediente se tornou o tema do “Brasil em Sabores”, um projeto do Ministério das Relações Exteriores para a promoção da gastronomia brasileira no exterior.

“O estudioso da gastronomia brasileira Câmara Cascudo chamava a mandioca de ‘A Rainha do Brasil'”, conta o chef e pesquisador Paulo Machado aos influenciadores e jornalistas japoneses que participaram de um almoço na Residência Oficial do Embaixador do Brasil no Japão, uma das ações do Brasil em Sabores. Machado desembarcou na Terra do Sol Nascente para apresentar a cozinha de sua região, a Centro-Oeste. Para a ocasião, ele preparou um menu no qual a mandioca apareceu em todos os pratos, das entradas à sobremesa.

Chef Paulo Machado, do Mato Grosso do Sul para o Japão (foto: Roberto Maxwell)

Participam do projeto quatro outros países. Além de Paulo Machado, estão envolvidos os chefs Morena Leite (Região Nordeste, em Angola), Saulo Jennings, (Região Norte/Peru), Janaína Rueda (Região Sudeste/Turquia) e Manu Buffara (Região Sul/Estados Unidos). A mandioca, cuja utilização e cultivo no Brasil são herança dos povos indígenas, foi o tema em comum para as ações em todos os países.

Cada chef escolheu ainda um pupilo que fica atuando na Residência Oficial do Embaixador do Brasil em cada país, oferecendo treinamentos de gastronomia brasileira para a equipe da residência e outros profissionais durante um período de aproximadamente dois meses. Para o Japão, veio como chef-pupilo Lucas Caslu, que é descendente de okinawanos e está em sua primeira viagem pela terra dos seus ancestrais. “Está sendo incrível. Muita experiência nova, muitas quebras de paradigmas. Cada refeição tem sido uma experiência nova”, diz.

 

Comida pantaneira

Nascido em Campo Grande (MS), Machado usou a raiz em versões autorais para pratos populares da gastronomia do Centro-Oeste brasileiro. O almoço oferecido aos jornalistas e influenciadores japoneses, foi aberto com uma chipa frita — espécie de pão de queijo — recheada com creme de queijo fresco. A iguaria veio acompanhada por uma bebida refrescante feita com mandioca, algo que surpreendeu os comensais. A degustação seguiu com o chipaguaçu de milho, uma espécie de torta que lembra um suflê menos aerado. Ambos os pratos são parte da influência paraguaia na região.

Drinque de mandioca que impressionou os comensais (foto: Roberto Maxwell)

O menu foi em frente com o caribéu, um ensopado de mandioca com carne seca. Como prato principal, foi servida uma picanha oreada (curada ao sol) com vinagrete acompanhada de arroz de pequi, feijão e farofa. Já as sobremesas vieram em dois momentos: uma mandioca frita com furundum (doce de mamão verde com açúcar mascavo) e um pudim de mandioca. À mesa, ainda, vinhos brasileiros da Casa Valduga, uma vinícola do estado do Rio Grande do Sul.

Boa parte dos insumos utilizados nos pratos, incluindo a mandioca, podem ser encontrados no Japão. A raiz, aliás, virou a marca registrada de muitos brasileiros que vêm deixando o trabalho nas fábricas japonesas para atuar na agricultura.

Os pratos surpreenderam os comensais, dentre eles o youtuber japonês Tsuyoshi Yamaguchi. Casado com uma brasileira, ele não é iniciante na gastronomia verde e amarela e costuma apresentar pratos do Brasil para a família e para os amigos japoneses, compartilhando suas reações em seu canal, o Olá Guti. Foi a primeira vez que Tsuyoshi provou a comida do Centro-Oeste brasileiro. “Estava tudo muito gostoso”, disse o jovem num belo relato à mesa, em português e japonês.

Chipaguaçu, influência paraguaia na gastronomia pantaneira (foto: Roberto Maxwell)

Educação e difusão

Outra ação importante envolveu um projeto educacional para levar a culinária brasileira para as salas de aula. Paulo Machado, Lucas Caslu e Arnaldo Lorençato, crítico de gastronomia e editor da revista Veja São Paulo, foram até a Hattori, uma das mais tradicionais escolas de gastronomia do Japão, para uma atividade especial com os alunos da instituição. Cerca de 100 estudantes ouviram atentamente as instruções dos professores e, em seguida, reproduziram alguns dos pratos do menu criado por Paulo Machado. “Fiquei impressionado com a precisão e a perfeição dos trabalhos deles após a aula”, conta o chef.

O trio também apresentou os preparos para cozinheiros de um grupo de restaurantes que topou participar de uma ação promovida pelo portal GuruNavi para destacar a gastronomia brasileira durante o mês de outubro. Cada casa irá oferecer um ou mais pratos inspirados no menu criado por Machado. O chef, que tem visitado alguns dos restaurantes, diz estar impressionado com a forma como os japoneses absorveram os pratos. Num deles, especializado em ostras, a equipe local criou uma coxinha recheada com o molusco e cogumelos da estação, acompanhada de um molho feito com missô.

Outra ação independente está sendo realizada no restaurante The Sky, do New Otani, considerado um dos hotéis mais elegantes de Tóquio. Com curadoria de Lorençato, o bufê da casa traz, até o final de setembro, pratos como o cuscuz paulista e a moqueca baiana, legítimos representantes da culinária brasileira. “O cuscuz, por exemplo, é receita da minha mãe”, diz o crítico, que conta que esta é a primeira vez que um país é destacado no menu do restaurante.

Cuscuz de camarão, receita brasileira no menu do The Sky (foto: New Otani/divulgação)

A presença do Brasil no The Sky também se dá na carta de bebidas. Dois drinques estão à disposição dos clientes, dentre eles a Komepirinha, uma versão da caipirinha feita com o shochu, um destilado japonês. A base do coquetel é produzida pela Kanemasu, uma fábrica da província de Niigata que, como a república brasileira, comemora 200 anos de existência em 2022.

O crítico de gastronomia Arnaldo Lorençato criou um menu especial para o The Sky (foto: Roberto Maxwell)

Gran chefs

O projeto também criou um espaço para que a comunidade brasileira no Japão fosse representada. Um dos almoços contou com a participação dos vencedores do Burajiru Gran Chef, uma competição de gastronomia organizada pelo Consulado-geral de Tóquio com o apoio das demais representações diplomáticas brasileiras no país.

Herculano Rotondano, Lucas Yamauchi e Bruno Ouchi — vencedores da primeira, da terceira e da quarta edição do concurso — puderam trabalhar com Lucas Caslu e com a equipe de cozinha da Residência do Embaixador por um dia. Os ganhadores também fizeram um treinamento online com o chef-pupilo e puderam aprender mais sobre a culinária pantaneira e a realidade atual do mercado gastronômico no Brasil.

Vencedores do Burajiru Gran Chef com Lucas Caslu (foto: Roberto Maxwell)

A quinta edição do concurso será realizada no mês de novembro, em Tóquio, e deve fechar com chave de ouro a série de eventos gastronômicos do Ano do Bicentenário da República no Japão.

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